sexta-feira, 10 de março de 2006

Reformados: Bezianos, Calviniſtas e Arminianos

A terceira menſagem intereßante do Bachega em alguns dias, e que me levou a publicar eſtas mal-traçadas. Sobre o Auguſtus Nicodemos Lopes, O Que Aconteceu com os Evangélicos?:

Bom artigo… ſó alguns comentários:

…Há opiniões divergentes sobre quando o moderno evangelicalismo nasceu. Aqui, adoto a opinião de que ele nasceu, como movimento, nas décadas de ’50 e ’60 nos Estados Unidos. Era uma ala dentro do movimento fundamentalista que desejava preservar os pontos básicos da fé (veja meu post sobre Fundamentalismo), mas que não compartilhava do espírito separatista e exclusivista da primeira geração de fundamentalistas. A princípio chamado de ‘neo-fundamentalismo’, o evangelicalismo entendia que deveria procurar uma interação maior com questões sociais e, acima de tudo, obter respeitabilidade acadêmica mediante o diálogo com a ciência e com outras linhas dentro da cristandade, sem abrir mão dos ‘fundamentos’.

Conheço ißo por neoevangelicaliſmo, por contrapoſição aos fundamentaliſtas e pré-fundamentaliſtas; talvez porque eu inclua fundamentaliſtas entre os evangélicos, como o Schæffer.

…queriam se livrar da pecha de intransigentes, fechados, bitolados e obscurantistas, ao mesmo tempo em que mantinham doutrinas como a inerrância das Escrituras, a crença em milagres, a morte vicária de Cristo, sua divindade e sua ressurreição de entre os mortos. Eram, por assim dizer, fundamentalistas esclarecidos, que queriam ser reconhecidos academicamente, acima de tudo.

Acho que a coiſa é muito mais ampla que a Academia, embora ela de fato ſeja influente através dos ſeminários. Os neoevangélicos, talvez inſeguros do amor de Deus, querem ſer aceitos pelo mundo, acadêmico ou não; também no clube, no trabalho, na eſcola, na vizinhança.

1. O diálogo com católicos, liberais, pentecostais e outras linhas sem que os pressupostos doutrinários tivessem sido traçados com clareza. Acredito que podemos dialogar e aprender com quem não é reformado.

A dificuldade do termo reformado, que a rigor inclui todos os proteſtantes ortodoxos, e na acepção reſtrita não engloba todos os evangélicos ortodoxos. Por ißo eu prefiro calviniſta, embora de tom mais ſectário.

4. O abandono da confessionalidade, dos grandes credos e confissões do passado, que moldaram a fé histórica da Igreja com sua interpretação das Escrituras.

Na verdade muitos batiſtas já não eram confeßionais, ißo é anterior ao fundamentaliſmo. Eu conſidero que o problema foi a congregacionalização de caráter quaſe-batiſta dos evangélicos, ſem que abſorveße a atitude bereana batiſta.

Não basta dizer que a Bíblia não tem erros. Arminianos, pelagianos, socinianos, unitários, eteroteólogos, neopentecostais – todos afirmarão isso.

Não concordo com a incluſão dos arminianos entre os hereges, até porque, na raiz hiſtórica, conſidero os arminianos como reformados, calviniſtas moderados, não-bezianos — o arminianiſmo foi feito por calviniſtas que não se conformaram à radicalização beziana, e a conſidero a remonſtração mais calviniſta que Teodoro de Beza. Meſmo o que talvez ſe poßa chamar o neoarminianiſmo de João Weſley ainda é diſtintamente reformado, afirmando por exemplo o pecado original.

Do que ſei do ſínodo de Dort, foi ſectário e radical ao ponto da impiedade. É um fato deſafortunado que muitas vezes quem é expulſo acaba decaindo (remonſtrantes, neoarminianos, velhos católicos, meſmo num prazo mais longo o proteſtantismo dito hiſtórico), mas conſidero que meſmo ißo deve ſer lançado na conta de quem expulſou ſe foi caſo de exceßo de legaliſmo ou apego a fórmulas.

Ao jogar fora séculos de tradição interpretativa e teológica, os evangélicos ficaram vulneráveis a toda nova interpretação, como a teologia relacional, a teologia da prosperidade, a nova perspectiva sobre Paulo, &c.

Que é eſta nova perſpectiva ſobre Paulo? Não sei.

5. A mudança de uma orientação teológica mais agostiniana e reformada para uma orientação mais arminiana. Isso possibilitou a entrada no meio evangélico de teologias como a teologia relacional, que é filhote do arminianismo.

Não acho juſto lançar neo-moderniſmos à conta de Jacó Arminius, aßim como não ſe pode lançar o fataliſmo à de João Calvino.

Permitiu também a invasão da espiritualidade mística centrada na experiência, fruto do reavivalismo pelagiano de Charles Finney.

Não ſeria mais preciſo chamar Finney de ſemi-pelagiano?

Essa mudança também trouxe a depreciação da doutrina em favor do pragmatismo, e também o antropocentrismo no culto, na igreja e na missão, tudo isso produto da visão arminiana da centralidade do homem.

Ißo não eſtá nem em Weſley nem em Arminius. Por outro lado, há também perigos do calviniſmo? Perigos há por toda parte…

Não há saída fácil para essa crise. Contudo, vejo a fé reformada como uma alternativa possível e viável para a igreja evangélica brasileira

Preciſamos deßa alternativa? Ou em outras palavras, é viável reſgatar eßas igrejas, ou é melhor deixar as coiſas antigas para trás?

Penſando bem, acho que tinha de publicar eßes comentários no meu blog…

(Que é o que agora faço.)

Violência doméſtica versus converſão

Mais uma vinda pelo Bachega, deſta vez do Jornal da Tarde de 8 de março de 2006, Agredidas em nome de Deus. Talvez o título ſeja injuſto, mas de bate-pronto meu comentário foi:

Uma peſquiſa (feita por romaniſtas) nos EUAN apontou a tendência dos evangélicos convertidos ſerem melhores maridos que os ſeculares, enquanto os evangélicos por tradição e herança serem piores. Creio que no Braſil eßa ſituação ſeja ainda complicada pelo legaliſmo, como aponta eße artigo meſmo.

Robinſon Cavalcanti: pós-moderno anti-moderno

O amigo Leandro Bachega mandou o eſboço da paleſtra A Igreja e os deſafios da pós-modernidade, do Robinſon Cavalcanti.

Aqui vão meus comentários:

Bom texto… ſó algumas notas:

4. …Secularismo, como desvalor das instituições e das experiências religiosas, radicalmente privada e sem mensagem ética social (necessidade do Capitalismo).

O Capitaliſmo é ſó um modo de produção, não ſe opondo à ética nem criando uma própria; mas é condicionado por ſeu ambiente. Assim, aparece numa Europa já em ſecularização, haja viſto o latitudinarismo inglês por exemplo.

O que incomoda no Robinson é ſua neceßidade de colocar em tudo a opoſição Socialiſmo–Capitaliſmo. É uma viúva do Socialiſmo, aparentemente.

5. Ocidente: o equívoco da resposta da Teologia Liberal (ou Modernista), uma hermenêutica de desmitificação, e a tentativa de ‘adequar’ a mensagem religiosa à mentalidade do homem moderno, esvaziando-a e tornando-a irrelevante, reforçando o Secularismo e levando ao abandono das Igrejas. Realidade particular do Protestantismo no Primeiro Mundo.

Na verdade ißo ocorreu também, em menor grau, no Romaniſmo. O biſpo de Roma hoje é a peßoa mais reſpeitada, mas menos obedecida da Europa — é a brincadeira que por lá corre.

A Pós-Modernidade vem junto com o fenômeno da Globalização Assimétrica, uma Ordem Internacional Imperial, O peso da ‘idéia única’ liberal-capitalista e o ‘Fim da História’ (Fukuyama).

Aí já se cai no partidariſmo. Chamar os EUA de imperiais é um bocado de exagero. Eles ſe comportam ſim como gendarmerie do mundo, mas incluſive a pedidos, por uma neceßidade que ſeria reſponſabilidade européia em ſuas antigas áreas de influência — às quais a Europa envia dinheiro que serve para ſuſtentar déſpotas nem um pouco eſclarecidos, e alivia criſes humanitárias, mas de nada serve para tranſformar culturas e evoluir economias; e às quais a Europa é incapaz de garantir ſegurança. Por exemplo, a ſituação iraquiana ſeria reſponſabilidade anglo-turco-rußa, mas eßas ‘potências’ não tinham a capacidade.

Quanto à globalização aßimétrica, é a conſeqüência natural do refluxo cultural europeu que concedeu independência às ex-colônias deſpreparadas para ißo. Um fato ſem ſolução a curto prazo, já que ſó uma re-evangelização reformada (não neceßariamente beziana) poderia fazer diferença.

11. …Os Espaços Não-Cristãos Ocidentais (Ortodoxia Oriental, Islã, p.ex.)

Deve ter ſido apenas engano chamar os orientais de não-criſtãos, ou talvez ele tenha querido dizer ‘fora da combinação criſtã-ocidental’.

13. O que temos que reconhecer, diante do novo quadro:

a. …o equívoco da nova Constituição da União Européia;

Equívoco ou reconhecimento de uma triſte realidade? Ou o equívoco não ſeria anterior, de querer juntar o que Deus ſeparou? Aliás por eſte critério, o Braſil e os EUA, meſmo a França, a Alemanha, o Reino Unido, a Eſpanha e a Suíça já ſeriam erros, no mínimo.

b. …ausência de projetos históricos alternativos, violência geopolítica (vítimas de várias formas de neo-colonialismo)

É difícil ter projetos hiſtóricos alternativos quando não ſe reconhecem ſequer as realidades econômicas. Ainda não vi nenhum realiſta, e duvido que seja poßível. Só o que antevejo é reconhecerem-se as duras realidades preſentes, trabalhando para modificá-las pela combinação de Evangelho (preponderante) e Ciência (ſubordinada).

E a vitimização dos ex-coloniais é baſtante ridícula do ponto de viſta hiſtórico. Quem tem matado o afro-aſiático-latinoamericano já há cinqüenta anos é o próprio afro-aſiático-latinoamericano mais rico e poderoſo, como ſempre foi até as Grandes Descobertas. E mesmo neße interregno, quem eſcravizava o africano era o africano. Muitos dos preſos de Guantánamo o foram por iraquianos reſpondendo a ofertas de recompenſa por captura de terroriſtas?

14. O equívoco de se vincular, necessária e genericamente, o terrorismo com o fanatismo ('fundamentalismo') religioso, ou com qualquer expressão religiosa em particular. A complexidade e a diversidade do fenômeno.

Não há engano nenhum aí, o terroriſmo do ſéculo XXI é baſicamente muçulmano, principalmente com a vitória recente ou próxima sobre IRA, ETA e grupos ſimilares.

O papel da tecnologia de comunicação: mídia, internet, telefonia móvel.

Ludiſmo? Difícil ſaber. O que os meios de comunicação têm a ver com o conteúdo da comunicação? Não ſe eſtá a discutir meios quentes vs frios (cinema vs televiſão, por exemplo).

A menos que ſe fale da maßificação da ſociedade de consumo e conſeqüente reação por parte dos excluídos dela.

Tese: O Fanatismo Religioso como 'Bode Expiatório' para uma Globalização Assimétrica, para as questões sociais irresolvidas (e onde não há vontade política de se resolver)

Vontade política? Que tal condições políticas objetivas? Lula prova que vontade não baſta… ou alguém duvida que ele, e o PT, têm vontade de fazer a Reforma Agrária, a diſtribuição de renda, eliminar a miſéria etc?

19. As igrejas evangélicas estão fragilizadas pelo excessivo divisionismo denominacional, fruto da própria fragmentação e desprezo à autoridade da Pós-Modernidade, e da falta de estudo e valorização de uma Eclesiologia Bíblica e Histórica.

Por outro lado, o denominacionaliſmo tende a validar os deſvios doutrinários e práticos hiſtóricos. Por ißo ſou localiſta.

É triſte que o Robinſon meſmo não reſiſta a modas, como a ordenação feminina, curſos Alfa etc.